sexta-feira, 22 de abril de 2011

Hegel

Os escritos teológico-religiosos tiveram grande importância no sistema hegeliano. A questão religiosa foi o ponto central do seu sistema. A partir do questionamento sobre “qual a essência da religião e procurando interpretar o sentido das diferentes formas pelas quais ela se manifestou na história” é que Hegel definiu o eixo no qual deveria girar todo o seu sistema. (Reale, 1991, p. 98).

Hegel considerou a religião grega harmoniosa na relação entre indivíduo e sociedade e a religião judaica contrastante. O cristianismo foi uma conciliação entre essas duas religiões. O amor é responsável por esta mediação. Aqui se observa um pouco da dialética de Hegel: “a cisão da realidade em opostos e a conciliação da cisão em síntese superior”. (Ibid., p. 99).

Nos escritos teológicos o cume da vida espiritual não é a filosofia, mas a religião. “Logo depois, Hegel inverteria os papéis: a Razão passa a exercer a função antes atribuída ao Amor”. (Ibid.). Os dogmas cristãos são considerados a base de seu sistema. Ele atribui à filosofia, especialmente ao seu sistema, a função de interpretar de modo verdadeiro a mensagem de Jesus, e afirmando ser o judaísmo responsável pela traição ao cristianismo.

É importante assinalarmos algumas chaves de leitura do pensamento de Hegel:
  1. a realidade enquanto tal é infinita;
  2. a estrutura que é a própria vida do espírito, onde se desenvolve o saber filosófico é dialético;
  3. a dialética possui um elemento especulativo em que marca o pensamento filosófico.

A realidade e o verdadeiro não são substâncias, mas sujeito, pensamento, espírito, atividade, processo, movimento, auto-movimento. “O Espírito se autogera gerando ao mesmo tempo a sua própria determinação e superando-a plenamente”. (Ibid., p. 102). O Espírito é infinito, ativo e realizando-se como contínua colocação do finito, e ao mesmo tempo superando-o. “Para Hegel, o infinito é a realidade mesmo enquanto ilimitada, potência de realização, isto é enquanto absoluto” (Abbagnano, 1982, p. 439). O verdadeiro infinito nega a realidade do finito como tal e o resolve em si: o verdadeiro infinito é aquilo que é, a realidade. É a realidade no sentido mais elevado. O infinito é a “força da existência”. (Ibid., p. 537). A realidade pode ser considerada “uma das categorias da lógica de Hegel: ‘… é a unidade imediata, que se produz, da essência e da existência que se atuou como existência, ou do interior ou do exterior’”. Ela é “a essência que se atuou como existência, ou o interior que se manifestou efetivamente no exterior”. (Ibid., p. 801).

J. W. F. Hegel entendia o absoluto como a síntese dialética do sujeito (pensamento) e do objeto (ser). “Se a essência da realidade é razão, então a razão é realidade. Isto significa: se o real é racional, então o racional é real”.(Bússola, 1993, p. 40). A ideia do real é cheia de conteúdo. “Hegel entende que a mais importante de todas as categorias é a relação pelo simples fato que tudo é relação, e o contraste ou contradição é a mais universal das relações”. (Ibid., p. 40-41). Ele se considerava um idealista absoluto, neste sentido as ideias são o que fundam a realidade última. P. Singer nos diz que as idéias, no sentido hegeliano, são nossas mentes ou pensamentos (Singer, 2003, p 95). Pensado assim o idealismo representa uma oposição ao materialismo. O ideia é o que aperfeiçoa a matéria no mundo.

“Segundo a lógica hegeliana, o mundo real é essencialmente um mundo potencial, isto é, em contínua mudança, e, portanto um mundo aberto para o infinito, pois não há limites para a potencialidade”. (Bússola, 1993, p. 41). Esta potencialidade é o vir-a-ser que dá à experiência a infinitude, enfim a idéia é infinita. O mundo está em constante mudança, ele é potencial. “A idéia é o absoluto (Deus) porque é infinita”. (Bússola, p. 41). Nesta relação dialética temos o constante vir-a-ser da realidade. O amanhã é causa do que existe hoje. Desta forma Hegel afirma que temos:

* O modo de ser do agora – que ele chama de tese, isto é a ideia em si;

O possível modo de ser diferente – que ele chama de antítese, isto é a ideia fora de si (no mundo na natureza);

O real e novo modo de ser de amanhã – que representa a síntese, isto é o produto desta evolução (o Espírito).

Não há final para o processo dialético. Sendo infinito, tudo se torna provisório. O espírito possui três aspectos:
  • Espírito subjetivo (a pessoa humana), o indivíduo;
  • O Espírito objetivo (Sociedade), sociedade civil e Estado Nacional;
  • Espírito Absoluto (Idéia universal – Deus).
Na questão de valores o indivíduo tem menos valor e… “acima de tudo está o absoluto que se torna presente à sociedade civil mediante o Estado nacional”. O estado é proclamado como osupremo representante do Deus invisível.Democracia não tem sentido nesta concepção, pois é “quantidade sem qualidade”, só tem valor “o governo que se identifica com o Estado”. (Bússola, 1993, p. 42). O ditador é a figura plenamente representativa do Estado Absoluto. Na ordem lógica temos primeiro a idéia depois a “sua realização transitória e caduca, mas evidente, cada vez mais aperfeiçoada, pois está em contínuo vir-a-ser. Na ordem ontológica, porém, o Infinito, o Absoluto, enfim, a idéia, como única e exclusiva realidade das coisas, não existem para além do finito, do criado, mas supera-o, anulando-o em si própria” (Ibid.). Isto lembra o “panta rei” (turdo é um) de Heráclito.

Hegel, em seu idealismo, procura superar as concepções que separavam as realidades subjetivas das objetivas. A pergunta então será o que é afinal o idealismo? Bussola resume da seguinte forma: "É uma doutrina filosófica que afirma que somente podemos conhecer com a certeza nossas idéias ou seja, o mundo interior da nossa consciência, o mundo da subjetividade” (Ibid., 1993, p. 43). Pitágoras apresentou um mundo inteligível oposto ao mundo sensível. Platão via que as idéias são princípios originais da realidade. Para Kant a realidade objetiva é ideia, “que só existe enquanto representa um ‘espírito que pensa’” (eu, consciência), e há “uma realidade em si à qual o espírito humano impõe suas formas” (Ibid.). Seu idealismo absoluto, sugere que nada pode existir fora do espírito. Este idealismo absoluto representa uma mediação para a filosofia do espiritualismo. “Estamos novamente na direção do platonismo, que havia estabelecido uma identidade entre ideia como objeto inteligível e a inteligência como tal” (Ibid.).

O pensamento de Hegel parece demonstrar a natureza íntima do ser humano, o que há de mais íntimo neste ser que é a consciência-de-si fazendo-se auto-consciente. Hegel demonstra também as possibilidades racionais do ser humano, absolutizando suas principais características: A observação da objetividade e da subjetividade. De certa forma há a superação das condições dadas pela objetividade e os limites da subjetividade. A direita e a esquerda hegeliana foram os pensamentos que perduraram. Porém, é na filosofia da esquerda hegeliana que houve melhores frutos para o pensamento filosófico.

Referências:

REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario. História da Filosofia: Do Romantismo aos nossos dias. São Paulo: Paulus, 1991, [v.3].
Bussola, Carlos. As correntes filosóficas contemporâneas. In: V.V.A.A. Introdução ao pensamento filosófico, 5ª ed. São Paulo: Loyola, 1993.
Abbagnano, Nicola, Dicionário de Filosofia, São Paulo: Mestre Jou, 1982.
Singer, Piter. Hegel, tradução de Luciana Pudenzi, São Paulo: Loyola, 2003. [col. Mestres do Pensar].